Tragédia horrível em Congonhas
Uma hiena devora o capitão Brandão
Todos os anos, na primeira quinzena do mês de setembro, arde em festas a cidade de Congonhas. Cessa momentaneamente o ir e vir dos admiradores de Aleijadinho, e do Brasil inteiro chegam peregrinos a render homenagens ao Senhor Bom Jesus de Matosinhos. São os tradicionais festejos do Jubileu.
Desde o momento em que Feliciano Mendes fincou a cruz no alto do morro do rio Maranhão, em princípio de 1757, fez a promessa e saiu peregrinando pelas mais longínquas paragens mineiras, revelando a graça alcançada com seu esmoler pendurado no pescoço angariando donativos para construir o que é hoje a monumental Basílica e as Capelas dos Passos de Cristo, o ir e vir dos peregrinos foi interrompido, presencialmente, apenas em três oportunidades: em 2009 diante da ameaça da "gripe suína", e em 2020 e 2021 pelo flagelo da Covid-19.
Nesses 244 anos de festejos dedicados ao Bom Jesus, continuamos a assistir as mais diversas demonstrações de fé das pessoas que vem a Congonhas, em especial, na Sala dos Milagres, onde encontramos os testemunhos dos romeiros, sejam em tábuas votivas, gravuras, pinturas, fotos, cartas, bilhetes, peças de cera, etc.
Congonhas se tornou a "meca espiritual do povo mineiro"[1], atraindo multidões aos "pés do Bom Jesus". E onde tem aglomerações, tem também espaço para o comércio, diversões e até para os espertalhões.
O principal objetivo dos festejos do Jubileu são as práticas religiosas realizadas pela Igreja e absorvida pelos peregrinos. Mas, o lado profano também permeava o Jubileu e tinha lugar especial. Acontecia do outro lado da ponte sobre o rio Maranhão, com a realização de bailes, jogos e certas atrações mundanas. Vinham de longe diversos artistas e os mais famosos circos. Apareciam museus de cera ambulantes e exposição de bichos exóticos. O Jubileu era uma grande festa. E dessas atrações, hoje vemos somente os parques de diversões.
Desde meados do século XIX, e durante os mais de 100 anos seguintes, uma das mais antigas tradições para divertir o peregrino em Congonhas foram as apresentações circenses.
Os circos aqui chegavam e se instalavam nas regiões mais planas da cidade, como próximo da atual praça Dr. Mário Rodrigues Pereira ou na região da "praia", onde se localizam, respectivamente, a UPA-24h e o estádio Pedro Arges.
No início da era do rádio no Brasil, os artistas passaram a vir a Congonhas para se apresentarem nos circos durante os festejos do Jubileu, no fito de aumentarem sua popularidade. Como foi o caso da dupla caipira "Cascatinha e Inhana" na década de 1930. Francisco Petrônio, Orlando Silva, Adelaide Chiozo, Chitãozinho e Chororó, e muitos outros, também marcaram presença por várias décadas e lançaram sucessos durante a maior festa religiosa do estado de Minas Gerais.
Os espetáculos contavam com musicais da época, além de mágicos, trapezistas, palhaços, dançarinas e domadores com animais exóticos (como leões e elefantes). Até lutas livres eram apresentadas ao grande público.
Mas, nem tudo acontecia de maneira ordeira e com final feliz.
Durante os festejos do Jubileu de 1918, o afamado capitão João Brandão, que pouco antes de vir a Congonhas, esteve em Belo Horizonte exibindo feras no circo "Pierre", sendo sempre aplaudido pela sua coragem e admirado pela sua cativante simpatia, teve um fim trágico em Congonhas.
Segundo nos dizem os jornais A UNIÃO, do Rio de Janeiro, e O MOVIMENTO, de Minas Gerais, capitão João Brandão foi estrangulado e devorado por uma hiena em pleno espetáculo no picadeiro do circo em que se apresentava.
Ao entrar na jaula de uma hiena, o destemido domador descuidou-se um pouco dos olhares da fera, para, naturalmente, atender os aplausos que irrompiam vibrantes, estrepitosos e prolongados da imensa multidão de espectadores.
Foi nesse momento de distração fatal que a hiena, num pulo rápido e certeiro, engarupou-se no arrojado domador, cravou-lhe os dentes na garganta e, em poucos minutos, o arremessou sem vida sobre o assoalho da jaula.
A multidão que presenciou essa horrível cena prorrompeu em gritos de desespero, enquanto o pessoal da companhia circense procurava fisgar o animal, matá-lo ou arrancá-lo da sua desditosa vítima.
Foi tarde. A terrível hiena só abandonou o capitão Brandão depois de reduzi-lo a cadáver e devorar parte de seu corpo, ainda quente.
A cena foi medonha e impressionou profundamente centenas de pessoas.
O capitão Brandão era natural de Santa Luzia de Carangola (atual Carangola), Minas Gerais, e se tornou conhecido domador em diversas partes do mundo.
Episódios bizarros como esse eram comuns em Congonhas durante os festejos do Jubileu, para desespero dos padres e organizadores.
Por André Candreva
Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Congonhas
Academia de Ciências, Letras e Artes de Congonhas
Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafaiete
Academia de Letras Brasil – RMBMG
Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais
Academia de Letras, História e Genealogia da Inconfidência Mineira
REFERÊNCIAS:
[1] - Frase de Israel Pinheiro - Governador de Minas Gerais, quando esteve no Jubileu de 1969;
Jornal A UNIÃO - 1918 - ed. 106
Jornal O MOVIMENTO - 1918 - ed. 137
Fotos - Museu da Imagem e Memória de Congonhas
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